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Pesquisa da UFPA analisa compromisso e casamento

Rituais de noivados ainda sofrem influências familiares e com herança patriarcal

“Em um momento em que as relações são sempre cheias de desconfiança e parecem cada vez mais voláteis, como alguém promete passar o resto da vida com outra pessoa? E esse ‘outro’ acreditar?”. Esta dúvida impulsiona as pesquisas do antropólogo Breno Alencar, aluno de doutorado do Programa de Pós-graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Pará (UFPA).

O antropólogo explica que as promessas de casamento, que atualmente podem ser interpretadas como “noivados”, são tipos de relações ainda mais antigas que o casamento em si. Ainda no Império Romano havia as “esponsálias”. Na idade Média havia dois tipos de “esposatium”, a “futuri” e a “presenti”. Na primeira tínhamos o compromisso de um casamento futuro, que seria mais perto do nosso atual noivado. Enquanto a segunda possuía um viés “oficializante” de uma relação que já se iniciava. Apenas ao longo dos séculos XIX e XX, diante da propagação do individualismo, é que surge o conceito de amor romântico e os indivíduos envolvidos no futuro enlace passam a escolher seus noivos e futuros companheiros.

Noivado é vínculo mais flexível - “Em cada momento histórico essa promessa possuía algumas características, porém o noivado é um conceito mais flexível do que o de casamento, o que permite a existência de um continuo de relações diferentes sob a mesma nominação”. Breno Alencar reforça que o noivado é menos sujeito a codificações jurídicas e litúrgicas que o casamento, se caracterizando como um ritual mais “frouxo”. Por um lado, tornando possível essas adaptações - como a coabitação ou escolha individual pelo parceiro - e, por outro, mantendo a aura de “sagrado”, “antigo” e “tradicional” que faz com que as pessoas pouco questionem estas alterações.

Assim, o noivado seria o período em que o casal já decidiu e/ou anunciou a intenção de se casar e se preparar para este relacionamento futuro. Os rituais desta fase também são marcantes. Em sua dissertação de mestrado “Entre a regra e as estratégias: uma abordagem antropológica sobre a escolha do cônjuge”, Breno Alencar destaca “o pedido”, “o jantar/almoço de noivado” e a “compra da aliança” como alguns destes elementos simbólicos. Nestes “gestos” características tradicionais como a influência familiar e a herança patriarcal da sociedade brasileira ficam evidentes.

Breno Alencar indica que ainda é “responsabilidade” masculina o pedido oficial pelo casamento. “Há uma certa pressão social para que seja feito um pedido público de casamento - durante um jantar ou almoço  - à família da noiva”, reunião que se torna uma celebração pelo futuro casamento. “O noivo é considerado um estranho e quase sempre um forasteiro que precisa da aprovação dos familiares da noiva”.

Este “rito de passagem” também está ligado as “despedidas de solteiros”. “Tais despedidas, em que não há, normalmente, componentes agonisticos, são constituídas por libações abundantes onde os noivos se deixam explorar pelos amigos, pagando prendas ou aceitando trotes, tudo por que estão ‘abrindo mão’ de sua companhia e da suposta liberdade que a antiga vida de solteiro lhes oferecia”.

Aliança tradicional ainda é a preferida - A compra da aliança também é um gesto simbólico que por um lado mostra a “promessa de casar” e por outro pode ser um indicativo da situação socioeconômica do casal. O anel deve ser metálico e, se possível, de ouro ou ouro branco. Este último mais caro e recomendado por vendedoras em joalherias. A maioria das mulheres prefere uma aliança “tradicional”, que não recebe preenchimento de nenhum tipo de brilhante e se destaca pela simplicidade e elegância.

O “processo de escolha do anel pode demorar dias e meses e leva em consideração a circunferência dos dedos anelares de ambos os noivos, o peso e formato do anel – que varia em gramas e espessura – e, claro, seu preço”. Pois, “o fato de estar diante de uma aliança coloca em questão seu coeficiente de mensurabilidade simbólica, haja vista que a mensurabilidade econômica e objetivo da aliança é monetariamente definida”.

Outro detalhe que não pode ser esquecido é a inscrição dos nomes do casal na parte interna da aliança “sob pena de receber duras críticas da noiva”.

O pesquisador aponta que “tornar-se noivo é assumir este papel introduzindo uma nova máscara que lhe permite - e obriga - encenar um conjunto de práticas e comportamentos característicos de um novo personagem. O uso da aliança é como esta máscara, pois é com e por meio dela que, em sua nova performance, este sujeito enfrenta sua plateia: a sociedade”.

Porque casar? Breno Alencar mostra que entre os fatores que mais influenciam a decisão de trocar alianças está a situação socioeconômica dos noivos, o tempo de namoro e – segundo afirmam as noivas – a situação do casal.  “Em geral o casal estabelece o momento ideal para noivar depois que alguns de seus objetivos pessoais são alcançados, o que envolve geralmente a idade, a aceitação seguida da cobrança por parte dos familiares, conquistas relacionadas aos estudos e, principalmente, a estabilidade financeira”.

Entre os casais pesquisados, após o noivado o casamento demora cerca de um ano para acontecer e “constatei que a origem do pedido dá-se quando a parceira questiona as intenções do parceiro e os seus objetivos em relação ao futuro do casal. Esta afirmação leva em conta o fato de que as noivas declaram haver um ‘tempo de vida útil’ do namoro, algo como ‘validade’ do relacionamento e que, portanto, exige do mesmo uma superação de fase”.

Em sua pesquisa de doutorado, o antropólogo irá se voltar para analisar a construção do casamento como plano ou como projeto de vida. “Minha pesquisa sobre a escolha do cônjuge entre noivos se liquefaz em entender a dinâmica da trajetória afetiva de um sujeito, capaz de comparar, escolher, se arrepender da escolha, comparar de novo e, quem sabe, se arrepender de ter se arrependido, mudando de opinião conforme a natureza da situação”.

Texto: Glauce Monteiro - Assessoria de Comunicação da UFPA
Divulgado em: 21/08/2015
Unidade: Programa de Pós-graduação em Antropologia e Sociologia da UFPA
Status: Pesquisador Brendo Alencar disponível para entrevistas.

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