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ASCOM UFPA

Pesquisa da UFPA analisa porque casais permanecem juntos

Insatisfações e expectativas de homens e mulheres são marcadas pelos gêneros

“E viveram felizes para sempre”. É assim que termina a maioria dos contos de fada, mas o que acontece após o “sim”? Porque os casais permanecem juntos ao longo de vários anos, mesmo quando há insatisfações com a relação? Estas e outras dúvidas inspiraram a dissertação de mestrado “Aquela esperança de tudo se ajeitar: continuidades e descontinuidades nos casamentos”, de Audrei Alencar, desenvolvida sob orientação da professora Denise Cardoso, no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da UFPA (PPGSA), antigo Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da UFPA.

Durante cerca de um ano e meio, Audrei Alencar observou treze pessoas, casadas há vários anos, que viviam com seus cônjuges na cidade de Bragança, no nordeste do Estado. Destas, o relato de cinco pessoas foram mostrados no estudo científico. Os dados da pesquisa foram obtidos em vários encontros com os entrevistados, no foco sobre os relatos de vida de cada um - que ajudam a entender suas percepções sobre casamento e relações afetivas -, e, finalmente, na observação do cotidiano das famílias durante a fase final do trabalho de campo.

Infidelidade como principal motivo para pensar em separação -“Não pude deixar de me espantar ao perceber que a maioria sequer já havia pensado em porque continuava seu casamento, e portanto, não tinha uma resposta num primeiro momento. Mas logo vi que a ausência, para os (as) entrevistados (as), deste questionamento, me ajudou muito mais, porque na maioria dos casos a reflexão acerca dos motivos da permanência se desdobrava ali mesmo na minha frente: ao se dar conta de que nunca haviam pensado nisto, a maioria iniciava, diante de mim, uma sequência de expressões indagadoras, frases desarticuladas e falas significativas, ora como se eu não estivesse presente – como se estivessem falando consigo mesmos – ora indiretamente me convidando a participar da busca pela resposta”, relembra a pesquisadora.

Ela explica que dentre os casais que acompanhou o principal fator que levava os cônjuges a pensar no divórcio ou na descontinuidade do casamento era a descoberta da infidelidade. “A descoberta de um caso externo ao casamento poderia ser motivo para descontinuidade tanto para mulheres como para homens; todavia, enquanto as mulheres só consideravam realmente graves casos escancarados – que ameaçassem sua condição de esposa, que fossem expostos em público, com grande indiscrição etc. – para os homens, qualquer caso da mulher, por menor importância que tivesse e por maior discrição com que ocorresse, já representaria motivo para descontinuidade”.

Para entender os motivos para manter-se casado, Audrei Alencar destaca que há uma relação íntima entre o porquê de continuar juntos e os papeis sociais esperados de cada gênero, pois os problemas e insatisfações relatadas eram também justificados por estes aspectos. “Das mulheres se espera o cuidado com os filhos, com o marido e com a casa, serviços domésticos, alimentação, limpeza, supermercado etc.; dos homens se espera o sustento da família, lavar o carro, serviços de mecânica, encanamento, dentre outros”.

Solidão, cuidado e apoio os fazem permanecer casados – Os principais motivos destacados pelos entrevistados para justificar sua permanência no casamento eram o medo da solidão, as pressões da sociedade, o status do casamento e a falta de apoio externo ao cônjuge.

“Medo de estar sozinho, especialmente na velhice, era o mais citado; o receio de se tornar ‘largada do marido’ e mal vista entre os familiares e a comunidade; a perda do status de casada/respeitada e do apoio financeiro, afetivo e prático que o companheiro representava. Havia nas falas também a ideia de que em caso de separação haveria a solidão e, em caso de uma nova relação, os problemas seriam os mesmos e, por isso, era preferível continuar com o esposo que já se conhece”, resume a antropóloga.

Entre as mulheres, os motivos que as levavam a permanecer casadas eram a capacidade do marido em contribuir total ou majoritariamente com o sustento da família e da casa, o comportamento adequado do marido (contribuição financeira, discrição nos casos extraconjugais, discrição em comportamentos ligados a “bebedeira” ou “farras”, entre outros), inexistência ou pouca ocorrência de agressões físicas e inexistência e/ou pouca ocorrência de descobertas de infidelidades devido a “acobertamentos”.

Entre os homens os motivos que tornavam o casamento satisfatório era a capacidade da esposa em gerenciar e realizar serviços domésticos, administrar o lar e cuidar da família; o comportamento adequado da mulher – que implica num recato, foco na vida doméstica e familiar, entre outros aspectos -, inexistência de “perturbações” da mulher – tais como discutir a relação ou tentar mudar o parceiro - e a qualidade sexual com a esposa e/ou com outras mulheres.

Por outro lado, as insatisfações dos homens com as mulheres se concentravam em dois aspectos: a infidelidade feminina, a qual seria intolerável, e a fuga do comportamento esperado da mulher.

Já elas reclamavam da falta de discrição nos casos de infidelidade; fuga do comportamento esperado do marido; falta de assistência afetiva, comunicativa e sexual; ocorrência de agressão física e sobrecarga com a divisão sexual do trabalho que as responsabilizava pelos afazeres domésticos e pela manutenção da relação.

“Os quatro motivos apresentados para a manutenção do casamento estão ligados, por sua vez, a uma ideia de indissolubilidade do casamento, de que ‘é para sempre’ e também sagrado; o costume na harmonia ou na pseudo harmonia do casal; o medo da mudança, da solidão e da perda de status e ainda a naturalização do sofrimento nas mulheres, porque ‘homem é assim mesmo e não presta’, em certa resignação que não exclui ‘aquela esperança de tudo se ajeitar’”...

Texto: Glauce Monteiro – Assessoria de Comunicação da UFPA
Publicado em: 23/06/2015
Unidade: Programa de Pós-graduação em Sociologia e Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (PPGSA/IFCH)
Status: Pesquisadora Audrei Alencar disponível para entrevistas.
Pesquisa completa aqui.
Fotos: Alexandre Moraes e Thinkstock

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