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Pesquisadores da UFPA analisam cemitério de tribos indígenas pré-coloniais da Amazônia

Por que investigar mortes que ocorreram séculos atrás?

Atualmente, a tecnologia é importante aliada para ajudar nas investigações policiais e revelar detalhes sobre assassinatos e mortes. Mas e se a morte aconteceu há algumas centenas de anos? Os pesquisadores Tiago Tomé, do Programa de Pós-Graduação em Antropologia (PPGA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e Claudia Cunha, do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS) da Universidade de Coimbra, Portugal, analisam os cemitérios arqueológicos do estado do Pará, e através destes, os costumes funerários das tribos indígenas pré-coloniais da Amazônia.

Irmã menos conhecida da mundialmente famosa antropologia forense, a antropologia funerária é definida pela pesquisadora como “o estudo do tratamento que é dado ao morto pela sociedade em que ele vive”. Cláudia Cunha explica ainda que “é uma área que junta antropologia cultural, biologia, medicina e osteologia” para recolher informações biológicas através dos ossos.  E com estas informações é possível para os pesquisadores montar um perfil biológico de um indivíduo e apontar sua idade, sexo, estatura e até algumas doenças das quais ele sofria, dependendo do estado de conservação dos ossos.

Cemitério dentro de casa? Mas porque estudar a morte de alguém que morreu há centenas de anos? Os pesquisadores da UFPA comentam que as práticas funerárias revelam muito sobre a vida social nas aldeias, o que por sua vez ajuda a resgatar a herança cultural da Amazônia.

“A maneira de enterrar o morto depende do que ele era em vida e o tratamento que é dado ao morto depende de fatores como sexo, idade e posição social do indivíduo”, assegura Cláudia Cunha. Já a forma e o local do sepultamento podiam variar dentro de uma mesma comunidade.

“Há comunidades indígenas que enterravam seus mortos dentro das casas, pelo fato desta sociedade não ter uma separação vincada entre o doméstico (o mundo dos vivos) e o funerário (o mundo dos mortos). Porém, algumas pessoas com um determinado status podiam ser enterradas no centro da aldeia em um cemitério mais próximo ao que temos hoje. A variação existe e tudo depende do tipo de cultura e a identidade do morto”.

Enterrado duas vezes! As análises da antropologia funerária podem trazer mais informações sobre a sociedade do que sobre o indivíduo estudado. No Pará, as pesquisas afirmam que uma das práticas mais comuns de sepultamento é a inumação secundária, ou seja, “Essa prática envolve o tratamento em várias etapas do cadáver – o corpo, inicialmente depositado em algum lugar para que ocorra a decomposição dos tecidos moles, é então desenterrado, os ossos limpos e posteriormente enterrados em um pote. Essa sequência de práticas constitui um ritual fúnebre complexo e que pode se prolongar por vários meses ou anos até que esteja concluído”, conta Tiago Tomé.

O pesquisador revela que esta prática existe em diferentes épocas e regiões do Pará. “É uma situação que parece existir em diferentes regiões do estado com diferenças cronológicas e até culturais no sentido de forma das urnas e tipos de decoração, mantida por povos relativamente distantes culturalmente e geneticamente”. 

Cemitérios mostram contato da cultura europeia e indígena - A variedade de rituais e costumes ligados a morte e sepultamento na Amazônia reforça que as comunidades indígenas são complexas e distintas. As pesquisas mostram que a história do contato destes povos com os colonizadores também pode ser revelada por meio da antropologia funerária.

“Em um mesmo território existiam povos diferentes com religiões diferentes e maneiras de enterrar os mortos diferentes. Os sítios arqueológicos trazem informações sobre as comunidades indígenas e também sobre os primeiros contatos com os europeus, como por exemplo, as doenças trazidas por eles e as formas de resistir a imposição da doutrina cristã em detrimento as religiões indígenas, que eram consideradas pagãs pelos colonizadores”, asseguram Cláudia Cunha e Tiago Tomé.

Ao analisar os restos mortais de um grupo indígena, é possível, por exemplo, observar doenças que só chegaram na Amazônia após o contato com os Europeus. “A muitas das doenças infantis que a gente tem hoje são herança europeia, como o sarampo, a varíola e a catapora”, explica Cláudia Cunha.

O contato com os Europeus também é observado em situações em que materiais ‘importados’ aparecem em contextos funerários indígenas “dentro de urnas antropomórficas indígenas já foram encontradas missangas de vidro de fabricação europeia acompanhando os ossos”, conta Tiago Tomé.

Pará possui importantes cemitérios arqueológicos - Os pesquisadores reforçam que as pesquisas multidisciplinares da UFPA em relação aos cemitérios arqueológicos contribuem para resgatar a história da região e que, apesar da tecnologia, são estudos que não são tão onerosos quanto possam parecer. “De forma acessível, estamos construindo um perfil osteobriográfico destes povos. Olhamos para o passado para entender melhor nosso presente e ajudar as populações locais a repensar o que elas desejam para o futuro da Amazônia”, assegura Cláudia Cunha.

Os cemitérios arqueológicos mais conhecidos do Pará estão localizados na Ilha do Marajó, mas também há este tipo de sítio arqueológico na bacia do Tapajós e do Xingu. “Na Ilha do Marajó há dezenas de sítios em que foram escavados enterramentos desde o século XIX. De uma maneira geral, são os mais conhecidos por conta da beleza das urnas funerárias encontradas na região. Por outro lado, nos sambaquis da Costa do Salgado, foram escavados enterramentos primários (fora de potes) de esqueletos em articulação”, conta Tiago Tomé.

Texto: Edson Costa – Assessoria de Comunicação da UFPA
Publicado em: 27/10/2015
Unidade: Programa de Pós-graduação em Antropologia
Status: Pesquisadores Tiago Tomé e Claudia Cunha disponíveis para entrevistas.

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